Quando Filipe Silva partiu à aventura pela Grande Rota das Aldeias Históricas de Portugal (GR22), de bicicleta, não esperava que a rota lhe oferecesse uma experiência tão rica e recheada de emoções. Eis o relato da sua viagem.

O que dizer da GR22? Questão de resposta complexa… O misto de pensamentos, emoções e memórias é tão extenso e diversificado que a resposta se torna um verdadeiro desafio por si só.

Foto de Filipe Silva

Inicialmente, a minha aventura anual de bicicleta não passava pela Grande Rota das Aldeias Históricas de Portugal (GR22) – mas esta foi capaz de me envolver de tal forma que fui, felizmente, atraído para ela.

Iniciei a viagem com algumas reticências, por ter conhecimento geral da região noutras viagens, de carro. Por ser terreno conhecido, retirava-lhe um pouco daquela emoção da aventura pelo desconhecido. Porém, atravessar a Serra da Estrela, num percurso circular, era, no mínimo, desafiante.

Foto de Filipe Silva

Afinal, a rota deu-me grandes lições – e todas as reticências se desvaneceram ao longo dos dias. Em primeiro lugar, somos imbuídos na paisagem de forma singular: a civilização quase se torna inexistente, já que só a curtos espaços temos contacto com ela. Assim, o que conhecia da região, de viagens anteriores, valeu quase a zero.

O misto de paisagens é assustadoramente positivo, desde as planícies da Raia Beirã, onde existe sempre um curso de água acompanhado pelos fabulosos carvalhos. As aldeias de rara beleza sucedem-se de forma natural, fornecendo uma imagem retrospetiva do que outrora fora a sua vivência, valores e função na região. Entre estas, nas referidas planícies, é possível por vezes planar, tendo em redor, por exemplo, o vale do Rio Douro como pano de fundo.

Foto de Filipe Silva

Pela GR22 passamos também pela alta montanha, traduzida aqui pela Serra da Estrela e Açor, nas quais andamos lá bem em cima, nas cumeadas, onde as eólicas giram e por vales infinitos a meia montanha como se ela nos quisesse reter indefinidamente. Naturalmente, a dificuldade é elevada, assim como a recompensa por lá pedalar.

Ao longo do caminho, deparamo-nos com vários pontos de assinalável beleza: realço, por exemplo, o Alto do Cebola. Não o descrevo, pois, cabe a cada um interiorizar o que se avista de lá. Todo o percurso é um misto de pequenos percursos em que a única monotonia é mesmo a constante mudança.

O piso raramente é amável para as nossas pedaladas. Recordo-me de um em particular, na descida para o Sabugueiro, que tinha tudo para ser uma descida espetacular – contudo, a combustão maciça de árvores, agregada às chuvas, tornou a experiência algo exigente. Apenas um exemplo de dezenas ou centenas de pequenos troços absolutamente fantásticos.

As pessoas são talvez o melhor da viagem. Tive o privilégio de conhecer e travar amizade com algumas e outras apenas por circunstância. Por razões diversas, a viagem levou-me a cruzar com pessoas mui nobres, desde populares irrepreensíveis na sua colaboração para uma melhor viagem nas suas informações e indicações, passando pelos operadores turísticos com a reconhecida simpatia e altruísmo beirão e por fim aqueles ligados às forças de socorro. Sim, tive de recorrer à ajuda de forças de socorro: considerando que há males que vêm por bem, o socorro a que tive de recorrer talvez venha a beneficiar positivamente a rota. Desejo muito, muito que sim. Foi mais uma grande, inigualável e muito recompensadora experiência por terras beirãs.

Por fim uma palavra, para um detalhe que por vezes nos passa pelo pensamento. De facto, esta é uma grande rota oficial, foi feito um investimento, tem um site em conformidade, com tracks, etc… Ao longo do percurso podemos pensar que se esqueceram dos utilizadores porque há troços muito desmazelados. Nada mais errado. Tive a honra de me ser provado o contrário, enquanto mastigava uns deliciosos amendoins em Marialva: recebi uma chamada de alguém com responsabilidades sobre a rota, querendo inteirar-se sobre a minha experiência. Foi um ponto muito alto na viagem. Não foi apenas um telefonema de circunstância, pois os telefonemas sucediam-se com troca de informações de parte a parte, para algo construtivo e gerador de mais valia. Afinal, há quem se dedique à contínua melhoria da GR22. Mais tarde, tive oportunidade de ter algumas noções sobre o que será possível realizar na GR22, em breve. Posso dizer que é algo inovador.

Que grande e quase indescritível experiência. Lancem-se pelos trilhos e algo de novo irão descobrir dentro de vocês…